Pablo Picasso, O Sonho, 1932
À cabeceira dos doentes, acontecera-lhe muitas vezes ouvir contar sonhos. Também ele tivera os seus. As pessoas contentavam-se, geralmente, em extrair dessas visões presságios às vezes certos, dado que revelam os segredos daquele que sonha; ele, todavia, pensava para consigo que tais jogos de espírito entregue a si mesmo tinham, sobretudo, a possibilidade de revelar a maneira como a alma se apercebe das coisas. Punha-se a enumerar as qualidades das substâncias que via em sonhos; a leveza, a impalpabilidade, a incoerência, a total liberdade em relação ao tempo, a mobilidade de formas de uma pessoa, que faz que cada qual seja muitos, e vários se reduzam a um só, o sentimento quase platónico da reminiscência, o sentido quase insuportável de uma necessidade.
Marguerite Yourcenar,
A Obra ao Negro, Planeta de Agostini, p. 194