Antigamente, antes da invasão, raras vezes pensei em observar a sentinela do Arsenal: (…) era o seu andar, o seu derreado de ombros que me impressionavam… era a moleza lenta do passo, uma expressão contínua e evidente de tédio e de fadiga; (…) E esta visão do nosso soldado parece-me então alargar-se e abranger toda a cidade, todo o País! Foi esta sonolência lúgubre, este tédio, esta falta de decisão, de energia, esta indiferença cínica, este relaxamento da vontade, creio, que nos perderam…
Ainda hoje me soam aos ouvidos as acusações tantas vezes repetidas do tempo da luta: não tínhamos exército, nem esquadra, nem artilharia, nem defesas, nem armas!... Qual! O que não tínhamos era almas… Era isso que estava morto, apagado, adormecido, desnacionalizado, inerte… E quando num Estado as almas estão envilecidas e gastas – o que resta pouco vale.
Eça de Queirós, A Catástrofe, em Contos
Ainda hoje me soam aos ouvidos as acusações tantas vezes repetidas do tempo da luta: não tínhamos exército, nem esquadra, nem artilharia, nem defesas, nem armas!... Qual! O que não tínhamos era almas… Era isso que estava morto, apagado, adormecido, desnacionalizado, inerte… E quando num Estado as almas estão envilecidas e gastas – o que resta pouco vale.
Eça de Queirós, A Catástrofe, em Contos
A acutilância do Eça é sempre boa de ler e de ser recordada.
ResponderEliminarA falta de energia num dia como o de hoje, de grande calor, é compreensível.
O tédio, a fadiga adormece o soldado que não tem esperança. O arsenal pode ser excelente mas se por trás dele não exstir a alma as armas de nada servem.
Às almas e não às armas. :) :)
Tenho de ler este texto do Eça, que não conheço e que muito me interessa.
ResponderEliminarEça, sempre contemporâneo... Julgo que nós, portugueses, estamos muito perto de perder as nossas almas! Eça sempre consegue transportar-nos para a suas paisagens escritas. Li e vi-me lá... junto com um povo que vai sendo minado no mais profundo do seu ego.
ResponderEliminarRestar-nos-à renascer com almas novas e indestrutíveis!
bjs
CF
Obrigada às três. Este excerto fez-me pensar que algumas características do povo português parecem endógenas, atravessando séculos, incólumes. Seremos imunes a algumas aprendizagens? Não retiraremos dividendos de situações críticas? Poderemos/saberemos renascer?
ResponderEliminarSempre pertinente e contemporâneo, este Eça. Sou uma apaixonada pelas "Farpas", onde, a quatro mãos, apresenta com Ramalho Ortigão um retrato tão eloquente, quão hilariante, do país à época e, poder-se-ia dizer, desta época também. Contudo, sou uma optimista inveterada e acredito que se não estamos bem, só poderemos (e iremos) melhorar!
ResponderEliminarBeijinho.
Apetece dizer
ResponderEliminarEça ao poder
Bj
Eça profeta! Espantoso - e assustador - como as coisas não mudaram um milímetro...antes pelo contrário: agora nem alma nem honra!
ResponderEliminarBeijo
R., Mar Arável e Justine
ResponderEliminarmuito obrigada pelos vossos comentários. De facto, é interessante ler Eça e pensar nas aproximações de épocas tão distintas. Todavia, também há diferenças, algumas a beneficiar claramente a época em que vivemos :).
Votos de um bom fim-de-semana para os três!
Qualquer semelhança com a actualidade portuguesa não é, infelizmente, uma mera coincidência.
ResponderEliminarCom certeza, Carlos. Creio que o próprio Eça se sentiria provavelmente abismado com o alcance temporal da sua visão.
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