Pablo Picasso, O Sonho, 1932
À cabeceira dos doentes, acontecera-lhe muitas vezes ouvir contar sonhos. Também ele tivera os seus. As pessoas contentavam-se, geralmente, em extrair dessas visões presságios às vezes certos, dado que revelam os segredos daquele que sonha; ele, todavia, pensava para consigo que tais jogos de espírito entregue a si mesmo tinham, sobretudo, a possibilidade de revelar a maneira como a alma se apercebe das coisas. Punha-se a enumerar as qualidades das substâncias que via em sonhos; a leveza, a impalpabilidade, a incoerência, a total liberdade em relação ao tempo, a mobilidade de formas de uma pessoa, que faz que cada qual seja muitos, e vários se reduzam a um só, o sentimento quase platónico da reminiscência, o sentido quase insuportável de uma necessidade.
Marguerite Yourcenar, A Obra ao Negro, Planeta de Agostini, p. 194
É pura coincidência trazeres aqui a Marguerite Yourcenar ?
ResponderEliminarComo a ela me referi na resposta à RUTE no jardim...
Muito bem utilizaste " a mobilidade de formas de uma pessoa, que faz que cada qual seja muitos" neste SONHO do Picasso.
Um beijo.
Foi coincidência, João. Acabei há pouco de ler o "A Obra ao Negro" e este foi um dos excertos que quis partilhar convosco. A propósito, não sabia que a Marguerite Yourcenar andou pelo Porto e ficou encantada com a Ribeira e a Sé. Muito bom! :)
ResponderEliminarObrigada e um beijinho.
Gosto muito de Marguerite Yourcenar, mas nunca li este livro. Tenho de ler. Bom Domingo!
ResponderEliminarQuerida Sara
ResponderEliminartens um dom especial de libertar do que lês, as palavras mais lindas e profundas...acho que vou voltar a ler este livro, pois assim como os sonhos, a cada leitura permitir-me-ei vivenciar a impermanência!!!
Num congresso, sobre oncologia, que fui há dias alguém disse: "sem sonhos não há matéria prima para se construir a realidade e os sonhos são uma expectativa razoável".... eu acho que sim!
bjs grandes
E a fragilidade dos sonhos quando se desperta, se desfaz
ResponderEliminare esse "sentido quase insuportável ... " de sonhar como se o fosse um porto seguro ?
é tudo tao fugaz e tão breve !
os tais "jogos do espírito"
que sonhemos, pois .
Gostei do fragmento Sara , o livro pareceu-me muito bom.Obrigada pela dica ,implícita.
Lindo pincel de Picasso.
abraços
Bem haja por ter conduzido Marguerite Yourcenar até nós. É sempre uma excelente escolha porque aprendemos muito com essa grande senhora.
ResponderEliminarUm beijo.
Saramiga
ResponderEliminarEncontrei-te no Interioridades do A.C. que escreve muito bem e com muito critério, bom gosto e sensibilidade.
E foi esse critério, bom gosto e sensibilidade que vim encontrar também aqui. Obrigado.
Marguerite Yourcenar, bela recordação. Foi como jovem jornalista ou jornalista jovem que tive a felicidade de a conhecer nos Estados Unidos. Foi já no seu período de orientalismo místico.
Consegui chegar à fala com ela, mandando-lhe recado por um amigo que também por lá estava, dizendo-lhe que minha mulher era Goesa. Recebeu-me e conversámos durante quase duas horas.
Como se tratava de conversa e de troca de opiniões e de impressões, prometi-lhe que não escreveria nada, a pedido dela. Guardei-a comigo. Refiro-a agora, só agora. ...
Qjs = queijinhos = beijinhos
Ela conhece como poucas pessoas as entranhas ocultas das pessoas e os seus mistérios.
ResponderEliminarSara,
ResponderEliminarEste seu post obrigou-me a vasculhar na prateleira, onde se abrigava uma edição de 1985 de A Obra ao Negro, da responsabilidade da Publicações D. Quixote. Na altura, ainda muito jovem e acabadinho de ler o belíssimo Memórias de Adriano, Yourcenar era referência. E ainda é. Mas faltava-me o estofo suficiente para o novo título. Li-o, é verdade, mas o desassossego foi constante.
Agora que me traz a memória do livro, quem sabe, talvez surja a vontade da releitura.
Obrigado.
Beijo :)
... tudo é tão frágil...
ResponderEliminarque nos valha sonhar
Boa memória
Lembra-me os versos de Sérgio Godinho: "em sonhos, é sabido, não se morre. Aliás, essa é a única vantagem"... :)
ResponderEliminarBeijinho grande e uma óptima continuação!
Os sonhos são muitas vezes uma fuga ao insuportável, outras vezes uma âncora, um caminho, uma força.
ResponderEliminarQue bom trazeres Yourcenar,a mulher sábia cujos livros devorei e que tanto me ensinaram...
Se se considerar um sonho como a sublimação de algo que ainda não foi conseguido, como algo que rendo ocorrido necessita de ser trabalhado para que a solução encontrada seja melhorada ou reformulada, então o sonho é um excelente recurso que está disponível.
ResponderEliminarSonhar com essa capacidade significa que a doença ainda não subjugou o paciente e este mantem bem viva essa capacidade de desejar.
A Yourcenar é uma garantia de leitura superlativa.
Bjs, Sara
Que bom que esta memória de Yourcenar foi do vosso agrado. E se o excerto foi, de alguma forma, um incentivo à revisita da obra, então este post já ultrapassou largamente as minhas melhores expectativas.
ResponderEliminarObrigada pelos vossos sempre estimulantes comentários.
Uma óptima semana para todos! :)
Um livro é uma fonte de saberes, por mais mau que seja.
ResponderEliminarSonhar, se aos sonhos nos referimos, eu sonhei que voava e acabei por estar três anos na FAP. Voei em quase tudo o que havia naquele então, que tinha hélices, quantas experiências, quase todas boas.
Os outros sonhos são quimeras...
Uma boa eleição de autora e de texto.
Abraços de amizade