Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício
Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição
Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsinore
E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmos só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
Mário Cesariny de Vasconcelos
"Palavras...palavras leva-as o vento..."
ResponderEliminarMas há palavras sussuradas que ficam gravadas na memória e cravadas no coração...
E há palavras escritas num pedaço de folha solta que guardamos preciosamente...
Como é bom, passado uns tempos tropeçar nele...ler e reler ...e relembrar!
E voltar a sorrir.
Meu Deus, Sara! Que delícia... Depois de um dia como este, voltei a sorrir, voltei a oxigenar o cérebro, até então poluido pela velocidade do dia. Mesmo a esta hora, voltei a ter vontade de pegar em mais livro e até de escrever o que pelo cansaço estava bloqueado. Tu alimentas-me a alma. Palavras, para quê? Mais...Só iria estragar o teu momento que humanamente decides partilhar!
ResponderEliminarObrigada.
Sou suspeita, porque há já muito elevei o Cesariny, a par do O'Neill, à categoria dos Deuses. E, como tal, venero-os. Ainda assim, não faltará quem concorde que esta é uma belíssima escolha.
ResponderEliminarAs palavras não são mais do que uma "pequena" mas grande tradução de pontes entre vocábulos, de consoantes que se agrupam para mimetizarem expressões, algumas delas mais infinitas do que a origem do primeiro alfabeto.
ResponderEliminarSe neste âmbar de sensações, juntarmos o simbólico do cheiro, do sabor e até qui ça, do paladar...buhm! faz-se magia:)
Viva!
Palavras para quê?
Obrigada pelas vossas PALAVRAS! A prova de que, apesar de "não termos connosco cordas de violinos nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar", ainda assim, as palavras dos amigos também "se escrevem muito alto".
ResponderEliminarUm grande fim-de-semana para todas!
Interessante passagem esta: you are welcome to Elsinore... É sobre palavras! Diz o texto. Serão mesmo só palavras? Quando as leram não vos passou um filme de imagens pelas vossas lentes vítreas? Vou sussurrar um segredo, que decerto não o será! Vou descrever o que senti e vi ao começar a ler este post...
ResponderEliminarParecia estar a entrar em Elsinore (imaginei este local tal qual aquelas lendas do rei Artur numa versão mais moderna)onde anunciava em grande cartaz de cinema as várias bobines de palavras que se fazem imagens. E todos os que foram assistir viram um filme diferente! Assim como eu, aqui neste momento escrevo uma série de barbaridades (quiçá) sobre os sentidos que emprestei às palavras impressas pela Sara. Eu sei que foi Cesariny quem as escreveu... Mas não terá sido a Sara na sua mestria de as ter escolhido tão bem que nos permitiu ver estes filmes tão deliciosos? Tenho saudades das lendas do rei Artur e tenho saudades dos filmes que falam de filmes como o "cinema Paraiso"
A esta hora terá sido o sono que me terá feito sonhar tanto... ou as palavras em Elsinore que nos convidavam ao sonho!!!!
Bom fim-de-semana a todas, mesmo sem conhecer a maioria. Foram ou não foram, por e pelas, palavras que travamos "acquaintance" ?
É verdade, as palavras abrem caminho a tantas possibilidades: à expressão, à evasão, ao sonho, à partilha, ao conhecimento, ao sentimento. Obrigada pelo seu texto, CF, muitas destas coisas lá estão. Mais um testemunho de alguém que, à semelhança de outras vozes que aqui se cruzaram, também respeita e ama as palavras.
ResponderEliminarUm bom fim-de-semana também para si!