domingo, 16 de maio de 2010

Daltonismo moral

La Escalera de Poder, de Carlos Revenga (2009)

Dizer que um homem não tem escrúpulos implica que esse homem nasceu com escrúpulos e agora decidiu pô-los de parte. Mas pode conceber-se um homem manifestamente “nascido” sem consciência? Um homem “nascido” sem as faculdades ordinárias da alma?
(…)
Há homens cujos sentimentos se vaporizam em neblina, como se fossem premidos por um vaporizador; aqueles que os congelaram – “agulhas e alfinetes de coração”; outros nasceram sem a noção dos valores, os agora afectados de daltonismo moral. Os muito poderosos são assim frequentemente (…)

Lawrence Durrell, Mountolive

10 comentários:

  1. A fotografia é fantástica! Gosto imenso de corvos.
    Quanto ao daltonismo moral, Lawrence Durrell tinha um olho clínico. Os poderosos são-no frequentemente!
    Bela associação com os corvos!

    ResponderEliminar
  2. Ana,
    a fotografia foi tirada numa mostra da Bienal de V.N de Cerveira e o mérito da associação é todo do artista, Carlos Revenga. Também achei uma associação muito adequada.
    Quanto ao daltonismo moral, o excerto poderá ser melhor compreendido no contexto da obra (grande limitação dos excertos...), uma vez que Durrell fala sobre os políticos de Alexandria nos anos 40, e sobre um em particular. Uma política regida por compadrios e favorecimentos, enfim, por uma moralidade daltónica. Mmmmm... lembra realidades próximas, não é?... :)

    ResponderEliminar
  3. Essa realidade do Egipto dos anos antes da guerra não é assim tão diferente do que infelizmente estamos a presenciar todos os dias: corrupção, ausência de ética, abuso de poder - o tal daltonismo moral!
    (não estava a conseguir entrar no teu blog, e estava por isso muito frustrada por não poder saber um pouco mais de uma fã do "Quarteto":)) )
    Vou espreitar-te e sentir-te. Voltarei:))

    ResponderEliminar
  4. Sara, este fim-de-semana ausentei-me no sentido mais lato da palavra... de tal forma que desliguei de tudo. Vou "confidenciar" algo: quando vinha de viagem no lugar de co-piloto, logo despreocupada com sinais de trânsito pensava, para comigo, no tema do seguinte post. As saudades de ir até a minha ilha virtual eram algumas. Deixarei de retórica e vou directa ao ponto... cruzei-me com uma pessoa que apresenta estas características visuais que descreves no teu post e vinha a pensar escrever sobre estes comportamentos (até no título pensei aludir a alterações visuais... vais rir-te... "ensaios sobre a cegueira"). Qd cheguei, já tarde, espreito o teu blog e fiquei surpresa e boquiaberta. Nem me atrevo a tentar dizer muito mais. Tão bem dito por Durrel! Acho que apanhaste muito bem o excerto e a imagem está espetacular. Diz outro tanto! Na minha modesta opinião nem é preciso enquadrar no restante texto tornando, muito mais, interessante ao leitor imaginar o que está para além do que desvendas... Infelizmente, neste caso não teremos grande dificuldade pois este daltonismo tem predominado, além do desejável e biológico, entre nós...
    bjs e bom inicio de semana

    ResponderEliminar
  5. Olá Justine
    é muito bom encontrar afinidades literárias por esta blogosfera. Posso dizer-lhe que fiquei definitivamente fã do "Quarteto": hoje foi "Clea" que me fez companhia, nas minhas viagens de comboio.
    Volte sempre que queira. É muito bem-vinda!:)

    ResponderEliminar
  6. Olá C.!
    também quero uma "ausência" assim :( Tou muito precisadita :)
    De facto, é curiosa a coincidência. É bom sinal! E obrigada pelas tuas palavras, todas elas. Fico contente por gostares dos excertos. É que por vezes fico com a impressão de estar a amputar a obra e de não conseguir transmitir a força das ideias do autor. Mas também me agrada (e tranquiliza) a tua perspectiva :)
    Beijinhos e que tenhas uma semana cheia de sol, no sentido mais lato da palavra :)

    ResponderEliminar
  7. Olá novamente
    Quanto às ausências...já estava no limite das minhas forças e este fim de semana deu para ficar "resplandecente" como o sol.. A baía de Cascais fez milagres e a Costa da Caparica tb. Sabes, praia e sol é comigo tb... dá-me paz e relaxa-me.
    Quanto aos teus receios de amputação... nem penses dessa forma!!! Acho inclusive, que acrescentas mais umas quantas "pernadas"... Um dia peço-te emprestado esse Quarteto do Durrel. Confesso a minha ignorância no que diz respeito à literatura estrangeira (actualmente ignorante em muita coisa, diga-se). Os doutoramentos absorvem-nos por completo mais a família... enfim!
    Queixar-se para quê? "Deitamo-nos na cama que fizemos" o que não quer dizer que, de vez em quando, não tenhamos uns lençóis mais perfumados e camas em outras paragens aliciantes onde nos "ausentamos"... lololol
    bjs
    CF

    ResponderEliminar
  8. Quando terminei a leitura, apenas uma pergunta me ocorreu: daltonismo moral... de quem?

    Beijinho e continuação de boa semana :)

    ResponderEliminar
  9. Daltonismo de quem? tantos!Cercam-nos...há que contra balançar com os que vêem bem!

    Quanto á foto..essa interpela...sendo eu uma apreciadora de fotografia não podia deixar de comentar...se bem que os corvos a mim assustam-me sempre...
    Passáros em geral (será por causa do filme do Hitchcock?? talvez!!) e corvos em especial, que associo à morte.

    ResponderEliminar
  10. C.
    as "ausências" são importantes. Eu gosto de me "ausentar" em livros, mas não renego ausências que envolvam partidas e chegadas, para além das literárias :) É que era já! :)

    R.
    a pergunta é pertinente. Na óptica de Durrell, e numa primeira abordagem, o "daltonismo moral" não seria aplicável a todos aqueles que se envolveriam em esquemas avessos à moralidade vigente (muito específica a um determinado contexto espacial e temporal), mas àqueles que não seriam possuidores de compreensão sobre a natureza das suas acções. O próprio escritor tem, no entanto, dúvidas relativamente a estes. Será que realmente um "daltónico moral" é alguém que nasceu sem consciência ou é aquele que, tendo essa consciência, continua a "confundir" de forma deliberada e informada esses valores? E como é que se poderá traçar essa distinção entre uns e outros?
    Acho que uma resposta possível acerca da leitura de Durrell está também nas personagens que criou. Nesse caso, para tirares as tuas próprias conclusões, terás que ler :)

    I.
    eu também não gosto particularmente de corvos, até porque não os associo a coisas muito positivas, tal como tu. Mas gostei da instalação e das ideias que inspiraram o artista. E ficamos por aqui... :)

    Para todas, beijinhos e um bom fim-de-semana!

    ResponderEliminar